Milhares de manifestantes se reuniram nesta sexta-feira (13) no imenso pátio da Mesquita dos Omíadas, ou a Grande Mesquita de Damasco, gritando em uníssono: “o povo sírio está unido”. A cena, inimaginável há apenas uma semana, quando Bashar al-Assad estava no poder, reflete a esperança de uma guinada no país, após décadas de ditadura. Os sírios saíram às ruas em todo o país, respondendo ao apelo do líder da coligação armada que tomou o poder em Damasco para celebrar a “vitória da revolução”, após a queda de Bashar al-Assad.
Desde as primeiras horas desta sexta-feira, dia semanal de oração na Síria, milhares de pessoas se dirigiram ao local. “A Síria foi libertada, nós fomos libertados da prisão em que vivíamos”, exclamou Nour Zi al-Ghina, 38 anos, no pátio da famosa mesquita. “Esta é a primeira vez que nos reunimos em um número tão grande de pessoas em um só lugar, a primeira vez que testemunhamos tal cena. Nunca imaginamos que esse dia chegaria”, insistiu à AFP este economista.
No domingo (8), a coligação armada dominada pelo grupo rebelde Hayat Tahrir al-Sham (HTS) tomou o poder em Damasco, após uma ofensiva que durou onze dias.
Muitos agitavam a bandeira da independência de três estrelas, símbolo da revolta pró-democracia de 2011, agora adotada pelas novas autoridades. Na cidade velha, os comerciantes vendem essas novas bandeiras que seria impossível ver nas ruas de Damasco há poucos dias. Os jovens faziam o sinal da vitória diante das câmeras da mídia árabe e ocidental. Esta cena inédita em Damasco trouxe de volta memórias das primeiras manifestações pacíficas que eclodiram na Síria, antes de serem reprimidas de forma sangrenta pelo regime de Bashar al-Assad.
Desde o início da revolta, em 2011, que degenerou em guerra civil, mais de 100 mil pessoas morreram nas prisões do regime sírio, muitas torturadas, estimou o Observatório Sírio para os Direitos Humanos (OSDH), em 2022.
Nas paredes da mesquita estão penduradas dezenas de fotos de pessoas desaparecidas durante o regime do clã Assad.
Mais cedo esta manhã, em vídeo no Telegram, o líder do HTS, Abu Mouhammad al-Jolani, que agora utiliza o seu nome verdadeiro, Ahmad al-Chareh, "parabenizou o povo sírio pela vitória da revolução" e pediu à população que "tomasse as ruas para expressar sua alegria". Ele ainda apelou à “construção do país”.
Em diversas partes da Síria, milhares de pessoas responderam ao apelo para celebrar. "Nada pode ser pior do que o que existia. Não temos medo da situação", disse à AFP, Amani Zanhour, professora de engenharia informática, expressando o seu apoio a um Estado baseado nos preceitos do Islã, mas que respeite as tradições de outras comunidades religiosas.
Omar al-Khaled, que veio direto da província de Idleb, no Noroeste, reduto do HTS, não conseguia acreditar. “O meu sonho era vir para Damasco, é a primeira vez na minha vida”, sublinhou o jovem estilista de 23 anos. “Mal consigo descrever o que sinto. As pessoas viviam sufocadas, mas agora as portas se abriram”, acrescentou.
Após a oração, os fiéis e outros moradores de Damasco foram para a Praça Umayyad, onde uma enorme bandeira foi hasteada perto do antigo quartel-general do Exército.
G7 examina a situação
Os líderes dos países do G7 se reúnem nesta sexta-feira por videoconferência para examinar a situação na Síria, onde o primeiro-ministro, nomeado na terça-feira (10) para liderar um governo de transição até março, prometeu estabelecer um "Estado de direito".
A Jordânia, por sua vez, sediará uma cúpula sobre a Síria no sábado (14), reunindo ministros e diplomatas americanos, europeus, árabes e turcos.
O chefe da diplomacia americana, Antony Blinken, se encontrou nesta sexta-feira em Ancara com o seu homólogo turco Hakan Fidan, um dia depois de uma visita à Jordânia, Blinken apela a “uma transição inclusiva” para um governo “responsável e representativo”.
O HTS afirma ter rompido com o jihadismo, mas continua sendo classificado como grupo “terrorista” por várias capitais ocidentais, incluindo Washington.
Numa carta enviada a Jolani, o Bahrein afirmou estar pronto para cooperar com as novas autoridades
UE envia ajuda humanitária
A União Europeia anunciou nesta sexta-feira a abertura de uma ponte aérea humanitária destinada à Síria, passando pela Turquia, Será a primeira ajuda europeia desde a queda do presidente Bashar al-Assad.
“Os voos de ajuda financiados pela União Europeia transportarão um total de cerca de 50 toneladas de material médico dos depósitos da UE em Dubai, que serão transportados para Adana, na Turquia, para distribuição através da fronteira nos próximos dias”, explicou a Comissão num comunicado de imprensa.
Outras 46 toneladas de ajuda serão transportadas por caminhão da Dinamarca para Adana, na Turquia, antes de serem redistribuídas na Síria, de acordo com o comunicado. O executivo europeu também irá liberar € 4 milhões (cerca de R$ 24 milhões) para reforçar o apoio humanitário total à Síria de €163 milhões este ano.
China e Egito falam em promover a paz
Reunidos em Pequim nesta sexta-feira, ministros das Relações Exteriores da China e do Egito discutiram sobre a necessidade de promover negociações de paz e a estabilidade no Oriente Médio.
O chefe da diplomacia chinesa, Wang Yi, declarou que ambos os países estavam profundamente preocupados com a situação na Síria e apelou ao respeito pela soberania, independência e integridade territorial do país.
O ministro egípcio Badr Abdelatty disse que havia discutido com Wang Yi sobre a importância de um "processo político global na Síria e a gestão de uma fase de transição que reflete a diversidade sectária, religiosa, étnica e racial na Síria".
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