Após a prisão do general Walter Braga Netto, ex-ministro e candidato a vice na chapa de Jair Bolsonaro, uma ala do Exército demonstra preocupação com o futuro do general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) no último governo. Heleno foi indiciado no inquérito da Polícia Federal (PF) que investigou a participação de militares em uma suposta tentativa de golpe. A avaliação desse grupo de militares é que, dado o grau de exposição do ex-ministro no enredo, ele deve ser um dos denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
A exemplo de Braga Netto, Heleno é um general quatro estrelas, a mais alta patente das Forças Armadas. Dada a relevância do posto, uma eventual prisão preventiva ou condenação são vistas internamente como medidas que poderiam afetar a imagem do Exército. Prisões de militares são muito ruins para as tropas, admitiu um oficial do Alto Escalão.
Em relatório, a PF afirma que Heleno usou recursos do GSI para disseminar informações de fraude eleitoral, com objetivo de criar um clima de instabilidade política que justificasse uma intervenção militar no país. A PF apreendeu na casa do general documentos que traziam “argumentos relacionados a inconsistências e vulnerabilidades nas urnas eletrônicas, servindo de subsídio para a propagação de informações falsas sobre o sistema de votação, linha de atuação do grupo investigado”.
À frente do GSI, que abrigava a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Augusto Heleno se tornou uma das principais vozes do Palácio do Planalto. Nas conversas em reservado, dizia que se Luiz Inácio Lula da Silva ganhasse a eleição presidencial o petista não assumiria o cargo. Em 2020, chegou a falar em “consequências imprevisíveis”, caso o aparelho celular de Bolsonaro fosse apreendido por ordem do Supremo Tribunal Federal. À época, o então presidente estava pressionado pelas acusações de suposta interferência na Polícia Federal.
Procurado para falar sobre a sua situação, Heleno não se manifestou.
Após conclusão do inquérito sobre o suposto plano, a PF deve encerrar até o fim do ano a investigação sobre a alegação de uma estrutura paralela na Abin para monitorar e atacar desafetos do governo de Jair Bolsonaro.
Integrante da linha dura do Exército durante o regime militar sua carreira foi marcada por posições polêmicas. Foi comandante da Missão das Nações Unidas no Haiti e em 2007, assumiu o Comando-Geral Militar da Amazônia, mas perdeu a função após criticar a “política indigenista” do governo no segundo mandato de Lula.
Ele conheceu o ex-presidente Jair Bolsonaro no fim da década de 70, quando era instrutor na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), em Resende, no Rio. Heleno foi inicialmente convidado para ser vice na chapa de Bolsonaro. Ele chegou a aceitar o convite, mas o PRP, partido ao qual estava filiado à época, vetou a coligação. Na sequência, Heleno solicitou sua desfiliação.
Preocupação com delação
Desde o envio da lista de indiciados à PGR em 21 de novembro, o Exército tem evitado se posicionar oficialmente. O argumento é que o processo ainda está em curso.
Integrantes do Exército dizem que a colaboração do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, ainda não foi totalmente explorada.
Além disso, o silêncio tem outra justificativa: o receio de se indispor com apoiadores de Bolsonaro nas tropas, sobretudo militares da reserva. A cúpula do Exército avalia que é melhor aguardar o desfecho do processo, ainda que o inquérito da PF sobre o alegado golpe tenha sido concluído. O plano é só tomar medidas efetivas após a Justiça aceitar a denúncia dos envolvidos.
Entre os envolvidos, quem está na ativa fica na situação de sub judice, não pode ser promovido, transferido, fazer cursos, ganhar medalhas e exercer cargo de comando. Já a punição para militares da reserva é a perda de posto e patente. Mas isso depende da possível condenação pelo STF e do prazo de reclusão. Caberá ao Superior Tribunal Militar (STF), uma espécie de Corte de honra, decidir se o militar é indigno da carreira.
Neste momento, o Exército está providenciando o retorno do coronel Fabrício Moreira de Bastos, adido em Tel Aviv, capital de Israel. O militar em posto de destaque no exterior foi indiciado no inquérito da PF sobre a suposta trama golpista. A demora se deve aos trâmites da transferência e substituição no cargo, segundo a Força.
O Comandante do Exército, Tomás Paiva, tem orientado os comandantes das unidades onde os militares estão presos a assegurar que os reclusos não sofram qualquer interferência do direito de defesa.
De forma reservada, a cúpula da Força tem dito que os militares envolvidos devem resolver a sua situação com seus advogados e se defender perante a Justiça. Segundo a cúpula, a ideia é buscar um distanciamento cada vez maior dos militares ex-integrantes do governo de Jair Bolsonaro na rotina dos quartéis.
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